É a primeira vez que um órgão criado a partir de células tronco se
mostra funcional em um modelo vivo, o que pode abrir portas para técnicas
futuras de transplante de órgãos.
Em mais um avanço da medicina,
uma equipe de cientistas americanos conseguiu implantar mini-órgãos criados em
laboratório a partir de células humanas em ratos. O experimento é considerado
um primeiro passo promissor para uma futura possível técnica que envolve a
criação de órgãos inteiros
em laboratório para transplantes médicos.
Criar “mini-órgãos” (também
chamados de organoides) em laboratório não é exatamente uma novidade: há pelo
menos uma década se estuda a técnica, que, em 2013, foi eleita como um dos 10
maiores avanços da ciência naquele ano pela revista The Scientist. O processo
envolve o uso das chamadas células tronco – que surgem no ser humano ainda na
fase embrionária e que são capazes de se diferenciar em diferentes outros tipos
de células que formam todo o seu corpo, desde os neurônios do seu cérebro até
as células de sua pele. Com isso, os cientistas conseguem induzir que as
células-tronco se tornem tecidos específicos e diferente e criar os organoides
em laboratório que imitam os órgãos naturais.
Só há um problema: células tronco
não são um material muito fácil de se conseguir – afinal, elas se formam em
embriões pouco depois da fecundação e há um grande debate ético sobre colher
essas células a partir de fertilizações in vitro. Por sorte, a ciência
desenvolveu uma técnica para “criar” células tronco em laboratório. As chamadas
“células tronco pluripotentes induzidas” são, na verdade, células de tecidos
humanos que, após uma série de processos químicos, adquirem a mesma
característica de células tronco naturais e conseguem se desenvolver em
qualquer outro tipo de célula, sem envolver embriões no processo.
Foi isso o que a equipe do novo
estudo fez. Os cientistas da Universidade de Pittsburgh usaram células da pele
de voluntários humanos para criar células tronco pluripotentes induzidas. Essas
células então foram estimuladas com hormônios e outras substâncias químicas a
se transformar em diferentes tipos de tecidos que formam o fígado. Com essas
células e um modelo de fígado real de um rato, os cientistas criaram
mini-fígados artificias em laboratório que pareciam funcionar igual ao modelo
real. Mas uma coisa é os órgãos funcionarem em laboratório, e outra
completamente diferente é que os resultados positivos também apareçam em um
modelo vivo, muito mais complexo.
Para a surpresa dos
pesquisadores, porém, os organoides cumpriram sua função também depois que
foram implantados em cinco ratos vivos. Após quatro dias do transplante
recebendo um tratamento para se evitar a rejeição dos órgãos, exames revelaram
que os fígados implantados secretavam ureia e bile, assim como o fígado real
faz em nosso corpo. Além disso, proteínas humanas foram identificadas no sangue
dos ratos, confirmando que os organoides estavam de fato funcionais.
Nem tudo foi perfeito, no
entanto: problemas de circulação sanguínea foram identificados e alguns ratos
desenvolveram trombose por conta da má conexão entre o órgão transplantado e a
rede vascular do animal. Mas a equipe já esperava que houvesse falhas, dado o
caráter pioneiro do experimento, e a iniciativa nunca teve a pretensão de ser
um transplante permanente que deixaria os ratos viverem para sempre. Todos os
resultados foram reportados na revista Cell.
Mesmo assim, o estudo é
considerado bastante promissor, porque mostrou pela primeira vez que órgãos
criados em laboratório podem ser funcionais em modelos in vivo. Apesar de ser
uma ideia distante, os pesquisadores afirmam que a técnica pode ser um dia
usada para criar órgãos humanos inteiramente em laboratório para fins de
transplantes. Até lá, a técnica poderia ser usada para criar soluções
temporárias para alongar a vida de pacientes que estão na lista de
transplantes.
“O objetivo a longo prazo é criar
órgãos que possam substituir a doação de órgãos, mas, em um futuro próximo,
vejo a técnica como uma espécie de ponte”, diz Alejandro Soto-Gutierrez, autor
sênior do estudo. “Por exemplo, no caso de uma insuficiência hepática aguda,
você pode precisar apenas de reforço hepático temporário, em vez de um fígado
inteiro novo”.
Em um futuro ainda mais próximo,
os organoides transplantados podem também servir de modelos para diversos tipos
de experimentos, como testar medicamentos e procedimentos médicos. Isso já é
feito com mini-órgãos em laboratório, mas os modelos in vivo podem trazer
resultados mais próximos dos reais, segundo a equipe.
fonte: superinteressante
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