Presidente chegou a anunciar resultados, mas se recusou a mostrar
documentos por dois meses.
Laudos entregues pelo governo ao
Supremo Tribunal Federal (STF) indicam que o presidente Jair Bolsonaro teve
resultado negativo nos exames para o novo coronavírus. Os exames foram abertos
ao público nesta quarta-feira (13).
Antes, o presidente já tinha
anunciado os resultados negativos em redes sociais, mas se recusava a mostrar
os laudos em si.
Os três exames usaram o método
PCR, considerado mais eficaz porque rastreia o material genético do
coronavírus. Ele identifica bem a Covid-19 a partir dos primeiros três dias de
sintomas – diferentemente do teste rápido, que tem eficácia maior após o 10º
dia de sintomas.
Segundo ofícios anexados pela AGU
no Supremo, foram utilizados nos laudos
nomes de terceiros para preservação da
imagem e privacidade do presidente da República e por questões de segurança. O
CPF e a data de nascimento nos papéis são, de fato, de Bolsonaro.
"Para a realização dos
exames foram utilizados no cadastro junto ao laboratório conveniado Sabin os
nomes fictícios Airton Guedes e Rafael Augusto Alves da Costa Ferraz, sendo
preservados todos dados pessoais de registro civil junto aos órgãos
oficiais", afirma o ofício do Comandante Logístico do Hospital das Forças
Armadas, Rui Yutaka Matsuda.
O processo chegou ao Supremo
Tribunal Federal e, na noite desta terça (12), a Advocacia-Geral da União (AGU)
forneceu os laudos ao ministro relator, Ricardo Lewandowski. Os papéis foram
mantidos em envelope lacrado e, no início da tarde, Lewandowski determinou a inclusão
nos autos, sem sigilo.
"Determino a juntada aos
autos eletrônicos de todos os laudos e documentos entregues pela União em meu
gabinete, aos quais se dará ampla publicidade", afirmou o ministro na
decisão.
A ação movida pelo
"Estadão" foi marcada por idas e vindas. O jornal chegou a receber
decisões favoráveis, com a determinação de que o exame fosse entregue em 48
horas, mas o governo conseguiu reverter a ordem no Tribunal Regional Federal da
3ª Região (TRF-3).
O jornal recorreu, então, ao
Supremo. Nesta terça, a AGU decidiu entregar os laudos antes mesmo de uma decisão
do ministro Lewandowski.
Confira, abaixo, os detalhes de
cada teste apresentado pelo governo ao STF.
Primeiro exame
- Data: 12 de março
- Nome: Airton Guedes
- Método: RT-PCR Tempo Real
- Resultado: negativo
- Processamento: laboratório privado
O laudo mais "antigo"
entregue ao STF indica que a primeira amostra foi coletada em 12 de março por
uma equipe do Hospital das Forças Armadas. O resultado foi liberado às 13h47 do
dia seguinte.
O documento mostra o nome Airton
Guedes – um codinome, segundo o governo. O CPF e a data de nascimento conferem com
os dados de Jair Bolsonaro.
O teste foi feito pelo método
PCR, considerado mais preciso porque detecta o material genético do
coronavírus. O ideal é realizar esse exame de 3 a 7 dias após o primeiro
sintoma, ou após o contato com alguém contaminado.
A coleta do material foi feita
dias após Jair Bolsonaro retornar de uma viagem oficial aos Estados Unidos, em
março. Naquele momento, uma TV americana chegou a afirmar que o presidente
tinha sido contaminado, sem apresentar documentos.
Ao longo daquele mês, pelo menos
23 pessoas que participaram da viagem oficial testaram positivo para a
Covid-19. O primeiro diagnóstico foi do secretário de Comunicação da
Presidência, Fábio Wajngarten, que já voltou ao Brasil isolado no avião e fez o
teste após o desembarque.
Segundo exame
- Data: 17 de março
- Nome: Rafael Augusto Alves da Costa Ferraz
- Método: RT-PCR Tempo Real
- Resultado: negativo
- Processamento: laboratório privado
O segundo exame foi registrado no
sistema do laboratório no dia 17 de março, cinco dias após a primeira testagem.
A repetição é parte do protocolo de segurança e ajuda a evitar um "falso
positivo" causado pela janela imunológica – quando o vírus já está no
corpo mas ainda não pode ser detectado.
Nesse teste, o paciente aparece
com o nome de Rafael Augusto Alves da Costa Ferraz. O CPF e a data de
nascimento, mais uma vez, são os dados de Jair Bolsonaro.
O segundo exame também usou o
método PCR, considerado mais preciso. Após esse teste, o presidente voltou a
anunciar resultado negativo, sem apresentar qualquer comprovação.
Terceiro exame
- Data: 18 de março
- Nome: Paciente 05
- Método: RT-PCR Tempo Real
- Resultado: negativo
- Processamento: Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)
terceiro exame foi feito em 18 de
março, um dia após o segundo. A amostra, desta vez, foi analisada em um
laboratório público da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Mais uma vez, foi o usado o
método PCR, mais preciso, a partir de amostra de "secreção de nasofaringe".
O resultado também deu negativo.
O "dono" da amostra é
identificado apenas como "Paciente 05". No documento entregue ao STF,
não há qualquer dado relacionado ao presidente Jair Bolsonaro.
Em exames do tipo, é comum que
uma mesma coleta de material dê origem a dois exames distintos. Isso pode ter
acontecido no segundo e no terceiro exames, analisados com apenas um dia de
diferença. Os documentos enviados ao STF não trazem essa informação.
O coordenador de Saúde da
Presidência da República, Guilherme Guimarães Wimmer, afirma em ofício anexado
ao processo que o "paciente 05" era Jair Bolsonaro, e que o nome foi
omitido por segurança.
"Em razao do estado de
emergência em saúde pública decorrente do coronavírus e considerando a grande
repercussão pela mídia sobre o estado de saúde do Sr. Presidente da República,
foram adotadas medidas de segurança em relação aos exames, com o intuito da
preservação da imagem e privacidade do Presidente da República", diz
Wimmer.
"Nesse sentido, os dados
pessoais do Presidente da República foram preservados, e o exame em lide foi
enviado ao laboratório da Fio Cruz na cidade do Rio de Janeiro identificado
como Paciente 05."
Falta de cuidado
Os resultados de Jair Bolsonaro
no teste de coronavírus geraram preocupação porque, desde o início da pandemia,
o presidente da República infringiu, diversas vezes, os protocolos de
distanciamento social e isolamento recomendados pelas autoridades de saúde.
Dias após voltar dos Estados
Unidos, e já com a informação de que parte da comitiva estava contaminada,
Bolsonaro rompeu o isolamento recomendado pelos médicos da Presidência da
República e participou de um protesto na Esplanada dos Ministérios.
No ato, o presidente cumprimentou,
abraçou e tirou fotos com apoiadores. Naquele momento, já havia recomendação
para que todos evitassem aglomerações. Pessoas que tiveram contato com
pacientes da Covid-19 já eram aconselhadas, também, a manter isolamento preventivo.
O comportamento se repetiu em
diversas ocasiões. Em 11 de abril, por exemplo, Bolsonaro visitou obras de um
hospital de campanha em Águas Lindas de Goiás, cidade vizinha ao Distrito
Federal, e descumpriu regras de uso da máscara e de evitar aglomerações.
Em 19 de abril, na posse do
ministro da Saúde Nelson Teich, o presidente levou a mão ao nariz, falou ao pé
do ouvido e cumprimentou pessoas.
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